A PERMANÊNCIA DA MILITÂNCIA INSURGENTE
A
aposentação é uma fase da vida que sucede a muitas outras, umas por de mais
inquietas, outras (in)utilmente seguras e outras ainda (talvez, poucas) de
remanso aconchegado. Com a reforma apressa-se uma outra casta de desassossegos
(e, sobretudo de ruturas) que suscita, na vida de cada um, inopináveis
intimidações e/ou instigações, na contraditória presença de uma vida que se
ausenta e de uma outra que, embora ainda ausente, se presta (por cumplicidade)
ao diálogo da reinvenção. Apesar de alguns ganhos esperados, as perdas existem
e o espectro da desagregação persiste em atrair (na sua peculiar crueldade)
depreciações que envelhecem. Posto isto, interpelar (com convicção) o círculo e
a materialidade do que (realmente) pode fazer sentido torna-se um eficaz
antídoto para, com vantagem, alcançar um atraente porvir pese embora o que se
abandona do tempo vencido.
Enquanto
o corpo e a mente – solidários – permitem aspirar desses proveitos, há que
cuidar desse bem, aliás cada vez mais escasso, destinando desígnios ao tempo
incerto que o compõe. Confesso, que uma das atividades por mim adotada, por
arreigada oposição ao politicamente conveniente, está no empenhamento
aperfeiçoado da insurgência como prática libertadora de capturas múltiplas
cevadas nesta (e por esta) paradoxal democracia. Nela, cria-se e faz-se prosperar uma cultura surreal (política e
cultural) celebrando-se liberdades que, com descaro, se abastardam na densidade
(própria e estranha) de tuteladas obediências que se impõem num angustiante
crescendo. Dar forma à razão genuína, sentida e vivida como verdade,
torna-se (assim) num experimento de recomeçados questionamentos e de
infindáveis afinidades de reação e resistência.
Aqui, ali ou em todo o lado, não se pode dizer
tudo, não se pode falar de tudo e muitos não podem sequer falar. O tabu, a
ritualização e o privilégio dos que decretam e podem, aclaram assim os limites
do dizível assinalando as sombras da inclusão (ou os territórios da exclusão)
onde as singularidades se silenciam e os medos se escondem. O
politicamente conveniente não é, nem poderia ser, um lugar rumoroso. Ele nada
anuncia e a discrição é o seu poderoso disfarce. Habita (por isso), na
excelência do silêncio, os lugarejos onde se engenha o domínio e a acomodação
das verdades e dos saberes úteis. Verdades e saberes que obedecem a vontades de
poderes combinados, embora nem sempre amigáveis, que dão forma e traçam os
roteiros, beatos e amáveis, donde irrompe o dizível. A insurgência tem uma outra vontade, provavelmente avessa, não
desconhecendo que os poderes renascem sempre e que sempre reagem onde a
liberdade espreita. Assim sendo, a militância da insurgência regressa,
igualmente sempre, ao prólogo de um texto que o legitima acreditando que o
texto que sucede seja distinto, naturalmente para melhor…
Almiro Lopes, in Revista ESCOLAinformação
(SPGL), de janeiro de 2013