Os Segredos do Planeta Vermelho


Depois de Vénus, Marte é o planeta visitado neste 5º episódio da série Cosmos.

Carl Sagan fala-nos do nosso fascínio pelo planeta vermelho desde a transmissão de “A Guerra dos Mundos”, de H. G. Wells, desde a apresentação radiofónica feita por Orson Welles através da rádio CBS, e seu próprio fascínio pelos romances de Edgar Rice Burroughs, da série literária de ficção científica, Barsoom, exibindo algumas ilustrações feitas por Michael Whelan.

Carl Sagan leva-nos ao observatório que Percival Lowell construiu no Arizona para estudar os "canais" de Marte, os quais acreditava terem sido construídos por uma civilização desaparecida. Assim, Sagan leva-nos a recordar as anotações fantasiosas de Percival Lowell, seguindo a seguir pelo desenvolvimento dos foguetes feito por Robert Hutchings Goddard, até o lançamento das sondas Viking 1 e Viking 2, que foram em busca de sinais de vida no planeta vermelho.

O Dr. Sagan mostra-nos também um robô pesquisador do tipo Viking, que exibe um mecanismo maravilhoso para enviar milhares de fotografias e de outros dados para a terra. Ao explorar as espantosas paisagens do planeta vermelho, as Viking não encontraram quaisquer canais, nem artefactos, nem marcianos inteligentes.

Neste ponto, fala-nos das experimentações de seu saudoso amigo, um notável microbiologista, Wolf V. Vishniac (1922-1973) que inventou uma máquina para encontrar vida microbiana noutros planetas, a quem os seus amigos designavam por “armadilha do lobo”, lembrando-nos a possibilidade de encontrar vida em solo marciano. Esta máquina nunca foi usada devido às dificuldades orçamentais da NASA, permanecendo em aberto a questão da vida microbiana, passada ou presente no planeta Marte. Mas algum dia o ser humano poderá a vir desvendar se há vida na água gelada nas suas calotes polares.

Fala-nos também do projeto de um veículo móvel elaborado pelo Instituto Politécnico Rensselaer, que procuraria outros locais para explorar a superfície de Marte, numa espécie de premonição próxima em relação às missões mais recentes e bem-sucedidas, feitas pelos robôs de exploração "Spirit" e seu irmão gémeo "Opportunity", que exploraram Marte desde Janeiro de 2004.

Por fim, Carl Sagan especula a respeito de uma teórica terra-formação em Marte que eventualmente pudesse derreter o gelo das calotas marcianas, fazendo a água circular em canais para outras superfícies de Marte, retornando aos canais fantasiosos de Percival Lowell relatados no início do episódio, dando-nos sugestões para podermos libertar a atmosfera marciana de modo a criar vida no planeta vermelho. E ai, futuramente, os marcianos seremos nós!...

Cosmos foi uma série de TV realizada por Carl Sagan e sua esposa Ann Druyan, produzida pela KCET e pela Carl Sagan Productions, em associação com a BBC e a Polytel International, veiculada na PBS em 1980.




Mais em:
http://www.carlsagan.com/
http://pt.wikipedia.org/wiki/Cosmos

http://pt.wikipedia.org/wiki/Carl_Sagan

http://www.documentarios.org/serie/de

http://www.aeroespacial.org.br/educac

Chegada a Brest - 14º Dia - Parte II

Já anoitecia quando rumámos a Brest e por isso o caminho foi feito de noite. A cidade de Brest está localizada na borda ocidental da Europa continental, daí a expressão "Europa de Brest", e no centro ocidental da Bretanha, já bem próxima da ponta mais saliente da Bretanha, a ponta Finisterra.

Localizada numa península, a cidade de Brest foi desenvolvida num platô a poucas centenas de metros acima do mar e abrigada de nortadas. É também uma cidade envolta em fortes muralhas, que remontam à época medieval.

É um importante porto comercial, mas também o segundo porto militar francês, depois de Tolon. Por isso é sem dúvida alguma uma cidade que une a terra ao mar e que possui mil e um rostos que mudam ao ritmo da chegada e partida dos enormes barcos de mercadorias, da marinha francesa e outros, da chegada e partida das estações do ano e ainda das próprias marés.

Mas como Brest se encontra na Bretanha, que é sobretudo um lugar de chuva, intermediada de sol, com um céu sempre carregado de tonalidades que expressam essa ambiguidade. Brest é claramente a expressão mais agreste dessa ambiguidade. Como agreste é a cidade e o seu imenso, cinzento, ferrugento e estivado porto comercial.

A fundação de Brest deve-se a um assentamento que se concretizou num acampamento fortificado romano chamado Gesocribate” no final do terceiro século. Na Idade Média, a cidade de Brest formava uma paróquia que venerava sete santos, para honrar a memória de sete crianças abandonadas nas proximidades de Brest e a sua história esteve relacionada com o seu Castelo.

Mais tarde, em 1593, Henrique IV dá o título de cidade a Brest e em 1631, o Cardeal Richelieu tomou o seu porto, fazendo dele um dos primeiros portos defensivos da nação. Brest a partir daí cresceu em torno de seu arsenal, até à segunda metade do séc. XX. O seu arsenal bélico foi utilizado durante vários séculos, e o seu porto serviu como a principal base da marinha francesa na costa atlântica.

A cidade foi profundamente marcada por bombardeamentos durante a Segunda Guerra Mundial, e o seu centro foi totalmente reconstruído após a guerra.

No final do século XX e no início do séc. XXI, Brest foi desindustrializada e hoje é uma grande cidade universitária, com muitas e prestigiadas escolas. Brest por isso mesmo é hoje um importante centro de pesquisa, voltada principalmente para o mar, possuindo o maior Instituto Francês de Investigação para a Exploração do Mar, le Cedre (Centro de Pesquisa, Documentação e Experimentação em poluição acidental da água) e o Polar Institute.

Quando chegámos a Brest era já tarde e fomos conhecer a cidade que já tinha muito pouco movimento. Como dentro da cidade não havia qualquer lugar destinado a pernoita para autocaravanistas, fomos encontra-lo fora da cidade amuralhada, num lugar sossegado situado a sul da cidade, em frente do "Oceanopolis", o aquário de Brest.

Fonte: http://en.wikipedia.org/ http://pt.franceguide.com/ http://blog.vadrouille-covoiturage.com/

Concarneau - Ville Close - 14º Dia - Parte I



Na manhã do 14º dia de viagem saímos do Camping, na Península Conleau, em Vannes, com rumo a Brest, deixando para trás o bonito e calmo Golfo de Morbihan.

No caminho feito pela N165, que segue sempre paralela à costa, parámos a meio da tarde na cidade de Concarneau, também ela situada num pequeno golfo que lhe serve de porto.
Concarneau é também uma grande cidade litoral, situada na região bretã de Finisterra, onde o idioma bretão é o mais falado. Possui um dos maiores portos de pesca de França, que se dedica ainda hoje à pesca do atum, havendo outrora muitas indústrias de conserva de peixe, ligadas à pesca do atum e da sardinha. A indústria conserveira foi decaindo ao longo do tempo, no entanto, desde 1980, outras indústrias têm surgido, como a de construção de barcos e a do turismo de verão.
Concarneau possui duas áreas distintas: uma grande cidade moderna situada em terrenos continentais e a Ville Close, uma cidadela medieval murada, situada numa comprida ilha no meio do porto, separando o porto de pesca (lado continental), do porto de recreio (lado mar).
A Ville Close está ligada à marginal da cidade moderna por grande porta medieval que possui a ela ligada, uma ponte levadiça de ferro e madeira. Na outra extremidade da ilha existe outra porta, mas de mar, que possui um ancoradouro para uma balsa que faz uma carreira regular para a aldeia de Lanriec, do outro lado do golfo que lhe serve de porto.
Historicamente, a cidade antiga era um centro de construção naval. A Ville Close está hoje só dedicada ao turismo, com muitos restaurantes e lojas destinadas aos visitantes.
Estacionámos a autocaravana em frente da Marina de Concarneau e seguimos a pé para a visita à Ville Close. Não existe a possibilidade de conhecer a pequena vila medieval de outra forma que não seja a pé, estando proibida a circulação de veículos motorizados.
Caminhar por esta cidade murada é como voltar atrás no tempo e na história. A ilha foi fortificada entre o séc. XIV e o séc. XVII, e tem apenas algumas ruas principais, estreitas cheias de uma boa variedade de lojas com artigos regionais, bares, restaurantes, e belas casas medievais, bem como outras tipicamente bretãs de onde jorram coloridos gerânios (entre nós mais conhecidos popularmente por sardinheiras), nas floreiras das suas janelas.
Além das ruas principais, há algumas ruelas perpendiculares que vão dar a janelas ou portas (algunas hoje gradeadas em ferro forjado) abertas nas muralhas, que dão para o mar, onde os antigos habitantes poderiam sair com os seus próprios barcos para o golfo. Há também um percurso altaneiro pelas muralhas, de onde se desfrutam vistas espetaculares sobre a área envolvente.
Na marginal da cidade moderna de Concarneau, depois de se contornar todo o pequeno golfo interior onde se situa o porto, no caminho litoral para norte, designado Quai de la Croix, passa-se por uma zona de moradias esplêndidas de traça bretã, em frente da Praia Sables Blancs. Esta é a praia mais famosa da cidade, que em julho e agosto se encontra sempre com grande afluência de veraneantes.
Fonte: http://en.wikipedia.org/wiki/Concarneau http://www.afranceattraction.com/ http://www.brittanytourism.com/

Primavera dos Livros


Muito longe d'aqui, nem eu sei quando,
Nem onde era esse mundo, em que eu vivia...
Mas tão longe... que até dizer podia
Que enquanto lá andei, andei sonhando...

Porque era tudo ali aéreo e brando,
E lúcida a existência amanhecia...
E eu... leve como a luz... até que um dia
Um vento me tomou, e vim rolando...

Caí e achei-me, de repente, involto
Em luta bestial, na arena fera,
Onde um bruto furor bramia solto.

Senti um monstro em mim nascer n'essa hora,
E achei-me de improviso feito fera...
— É assim que rujo entre leões agora!

Antero de Quental, O Circo, in "Sonetos”

O tempo em que vivemos, esta nossa época desordenada e instável, votada à multiplicidade de pontos de vista, onde as certezas prevalecem sem ter que ser confirmadas, ou mesmo que o sejam e caiam por terra, tendem a fazer-se prevalecer como certas, é também um tempo de indefinições e incertezas, frente às quais tudo parece possível, plausível.

Mas é sobretudo um tempo de numerosas escolhas, que correspondem como não poderia deixar de ser, a múltiplas ofertas.

É assim também no que se refere à literatura, em tempos de globalização, que tende a uma uniformização e padronização dos gostos. Mas como há sempre uma luz ao fundo do túnel, julgo que o futuro do livro não está totalmente perdido.

Hoje é Dia do Livro português, e não queria deixar de o assinalar. Como este é também um tempo muito rico no que se refere às escolhas de leitura, aqui deixo a minha escolha, que como não podia deixar de ser, recai num belo livro lançado de fresco (23 de março de 2013), a “V Antologia de Poetas Lusófonos”, editado pela Folheto Edições & Design, Lda. de Leiria, onde a minha filhota tem quatro de seus poemas publicados. No total nesta V Antologia, estão publicados 147 belos poetas, oriundos de 15 países lusófonos.
(http://folhetoedicoesdesign.blogspot.pt/2013/03/convite.html)

Aqui vos deixo só um cheirinho:

Depressão pelo lado de fora

 
Nas esquinas do meu quarto
Nas paredes, nas fotografias nelas coladas
Na Mona Lisa despida à porta
Na televisão apagada
Na vela gasta, na electricidade cortada
Neste recanto do quarto onde me deito
Onde sempre quis ter gente sentada
Distraída.
Estou eu aqui denunciando a inércia de mais um dia de depressão,
                                                                                    olhando a gaveta
onde estão as cápsulas do país das maravilhas, em que acabo sempre descaída

 
Em passos vagarosos como a pressa que tenho por ti
Dirijo-me à cozinha onde no frigorífico
desligado sobra fruta que no dia anterior surti
já quente, comida num dia demente de chuva
sem raios de luz veemente
depressa este se põe, pois nele fingi que vivia,
de sorriso apagado
mas de coração apaziguado
merecido descanso soterrado
nas ausências dos nadas a que me habituei
E na humidade nocturna, namoro o escuro,
onde no íntimo, sempre vagueei
Devido a uma conta por pagar
Adormecendo pobre mas segura
que quando tudo está contra vontade
é porque anteriormente a consumimos,
mal ou bem,
Em Liberdade.

Lia Cardoso, in V Antologia de Poetas Lusófonos, pág. 294
 



"O myto é o nada que é tudo"



Ulysses

 
O mytho é o nada que é tudo.
O mesmo sol que abre os céus
É um mytho brilhante e mudo -
O corpo morto de Deus,
Vivo e desnudo.

 
Este, que aqui aportou,
Foi por não ser existindo.
Sem existir nos bastou.
Por não ter vindo foi vindo
E nos creou.
 

Assim a lenda se escorre
A entrar na realidade,
E a fecunda-la decorre.
Em baixo, a vida, metade
De nada, morre. 

Fernando Pessoa


"O myto é o nada que é tudo", a frase primeira deste poema de Fernando Pessoa dedicado a Ulisses, o mítico fundador de Olisippo (Lisboa), exprime a ideia dos mitos como potenciais motores sociológicos. Mesmo se falso um mito tem o potencial de provocar comportamentos sociais e, portanto, promover e facilitar a evolução, segundo determinados vetores.

"Mito, filosofia e história exprimem o espírito humano e são constituintes da cultura. A deformação do mito implica mistificação. A sobrevivência do mito na modernidade demonstra a força perene do simbólico como forma de conhecimento que sobrevive às crises por sua universalidade concreta e sua capacidade de atribuir sentido pleno à vida."

Neste episódio do Café Filosófico, Antonio Medina Rodrigues, José de Paula Ramos Júnior e Demétrio Magnoli, Professores da USP, Brasil, mostram a importância do pensamento mítico, na formação de uma nação e da nossa identidade cultural.



Fonte: http://www.historia.com.pt/ http://www.youtube.com/
 

Os riscos da Globalização

 
 

As grandes instituições que norteiam as relações entre os homens fundaram-se há centenas ou mesmo milhares de anos. A existência do mercado é uma dessas grandes instituições. Nele se cruzam os interesses de quem procura e quem vende ou troca, satisfazendo os interesses de ambos, se funcionar bem. O mercado é também o ponto de encontro de troca de informações entre o consumidor e o produtor. A este cabe detectar as necessidades do mercado e satisfazer essas necessidades, recebendo em troca a correspondente mais-valia. Simples.

 
O maior erro do marxismo foi decretar o fim do mercado como forma de eliminar a exploração do homem pelo homem, aliás, ignorando outro grande princípio das relações humanas: os homens não são iguais e, como tal, a cooperação nunca se traduzirá em ganhos iguais. A igualdade utópica não acontece no capitalismo como não aconteceu durante os regimes comunistas nem em nenhum outro, no passado. O mito da igualdade entre os homens não passou disso mesmo: um mito.
 

Da mesma forma, não há memória de um mercado sem autoridade. Bem ou mal, justa ou injustamente, os mercados sempre foram regulados por alguém, seja o senhor feudal, o alcaide ou o rei. Também o acesso aos mercados foi sempre limitado. Os interesses locais, regionais ou nacionais sempre se impuseram aos interesses exteriores. A não ser que, por força de acordos ou pela força da espada, os interesses das comunidades fossem subjugados diante de interesses maiores.


A Globalização não pode esquecer os erros do marxismo nem os outros erros que a história registou. As teorias de engenharia social que não respeitem os grandes princípios que fundaram a Humanidade estão irremediavelmente votados ao fracasso. Sejam o marxismo, o neoliberalismo económico ou uma certa visão de Globalização não regulada. Os arautos do marxismo viram o seu sonho ruir em 1989, quando Muro de Berlim lhes caiu estrondosamente em cima, depois de décadas a negar o óbvio: não há sociedade funcional sem mercado e sem livre iniciativa.

Também os fundamentalistas do mercado viram as suas teses reprovadas pela realidade, perante a crise de 1929 nos Estados Unidos ou as experiências ultra-liberais das últimas décadas na América Latina, que culminaram, nomeadamente, com o estrondoso colapso da Argentina, que só muito a custo tem recuperado da falência económica a que o País foi conduzido pelos seguidores de Milton Friedman. Curiosamente, a consolidação das democracias no sul e no centro do continente americano, defendidas – pelo menos aparentemente – pelas administrações norte-americanas trouxe a rejeição quase generalizada das teses neo-liberais que tentaram exportar.

A sobrevivência do capitalismo durante todo o século XX deveu-se à sua capacidade de adaptação aos tempos modernos. Com efeito, o capitalismo do início do século XIX parece uma caricatura face ao capitalismo do final desse mesmo século. A introdução de leis anti-monopolistas e de defesa do consumidor, a par da institucionalização do sindicalismo e do crescente respeito pelos direitos dos trabalhadores, processo liderado pelos países do norte da Europa, vieram dar um rosto humano ao capitalismo e torná-lo atraente aos olhos do mundo.

Pelo contrário, a ausência de democracia matou todas as hipóteses de reforma dos países comunistas. O colapso da União Soviética e dos países satélites foi o epílogo natural da ausência de mercado, da livre iniciativa e dos direitos políticos. Contudo, quem leu o fenómeno como a mera vitória do capitalismo sobre o comunismo errou redondamente na análise. Na verdade, não há apenas um capitalismo, mas muitas versões, bem diferentes umas das outras. O capitalismo norte-americano não é seguramente igual ao europeu e nenhum destes é igual ao capitalismo do outrora Império do Meio.

O advento do século XXI e da Globalização trouxe, na minha opinião, algum retrocesso civilizacional por via da chegada ao mercado mundial de um concorrente do terceiro-mundo de dimensão planetária, com uma população que corresponde a 1/5 da população mundial, o dobro da europeia e quatro vezes a dos Estados Unidos da América. A regulação do mercado construída durante mais de um século tem vindo a regredir para se poder ajustar a um concorrente que veio introduzir uma economia de mercado sem democracia. E se há lição que a história nos ensinou é que o pior inimigo da regulação do mercado é a ausência de democracia.

O aparente êxito económico chinês, baseado na ausência de direitos sociais e políticos e na desregulação do mercado, tem vindo a ser apresentado ao mundo como o paradigma do capitalismo do século XXI. E como queremos seguir o “êxito” chinês, com crescimento económico de dois dígitos, como os economistas fazem questão de nos recordar até à exaustão, assistimos à adopção de políticas que visam desmantelar progressivamente o estado social e reintroduzir legislações laborais tidas como obsoletas há dezenas de anos. A chamada flexisegurança, que implica que os trabalhadores tenham de trabalhar mais de 60 horas semanais nalgumas épocas do ano, é um dos exotismos da Globalização que o tempo se encarregará de demonstrar ser um erro. Embora não seja uma linha recta, a história não volta para trás.

A ideia é tanto mais abstrusa quando os mesmos governos que defendem a flexisegurança são os mesmos que se dizem preocupados com a baixa natalidade. Ora, não há família que resista a horários de trabalho semanais de 60 ou mais horas. No limite, a partir de agora, ou as pessoas têm emprego ou têm filhos. E como não podem prescindir do emprego, terão de prescindir dos filhos, que passarão a ser um luxo dos ricos ou um vício dos indigentes sem emprego. As consequências a prazo destas políticas de discutível alcance conjuntural serão um País de velhos, com reformas cada vez mais miseráveis. Basta utilizar as fórmulas da Segurança Social do inenarrável ministro Vieira da Silva para perceber, já hoje, que estamos (quase) todos a caminho de uma deprimente indigência na velhice.

Voltemos à Globalização e aos mercados. Como referi anteriormente, o acesso aos mercados sempre foi condicionado por ser vital para a sobrevivência das comunidades. Na minha opinião, continua a sê-lo. A economia de proximidade continua a ser vital em caso de guerra, epidemia, crise energética ou logística. A ideia de que nada disto irá ocorrer no futuro é um erro que terá inevitavelmente consequências catastróficas no futuro. A questão não é se estas crises irão acontecer, mas quando irão acontecer.

Recordo que há poucos meses, Portugal esteve à beira da paralisação total e da rotura alimentar, após alguns dias de paralisação dos transportes rodoviários. Pergunto: o que aconteceria se a paralisação durasse mais uma semana? Sem combustíveis para se deslocarem e sem alimentos nos supermercados para se abastecerem, as pessoas teriam vivido uma situação de pânico generalizado. Escapámos por pouco, mas como tudo se resolveu a tempo, mesmo por um triz, não aprendemos a lição e nada faremos para precaver este tipo de situações.

Um mercado globalizado pode implicar que um País abdique por completo de determinadas produções, mesmo agrícolas. Em Portugal, por exemplo, os governos têm defendido a ideia de que a produção de cereais é inviável, uma vez que outros países têm níveis de produção por hectare que são o dobro ou o triplo. Contudo, pergunto: o que comeremos nós em caso de crise internacional, se ficamos completamente dependentes do exterior? No meu ponto de vista, nenhum País deve prescindir de uma produção agrícola mínima de segurança, que permita às populações sobreviver durante alguns meses, em caso de crise, ainda que a produtividade dos solos ou as técnicas de cultivo não permitam produtividades que tornem as culturas competitivas num mundo globalizado.

Do mesmo modo, considero extremamente perigoso a inexistência de limitações aos fluxos financeiros internacionais. O caminho não é fácil, sem a criação de um regulador global para regular o mercado global. Os riscos deste modelo de Globalização estão à vista, não só com a crise do subprime nos Estados unidos da América, mas também com a actual instabilidade dos mercados petrolíferos. A elevada transferência de fundos financeiros de uma zona para outra do mundo, de uma área accionista para outra ou de uma matéria-prima para outra, sobretudo, se for efectuada num curto espaço de tempo, pode arruinar empresas, países ou uma zona do globo, de um dia para o outro.

Os especialistas têm avisado que a economia norte-americana está fortemente dependente dos fluxos financeiros chineses, que têm financiado, até agora, o seu monumental défice externo. O que acontecerá se ocorrer uma crise internacional, ninguém se atreve a prever e poucos ousam mesmo admitir este cenário. Ora, o bem-estar e os empregos de biliões de pessoas não podem estar dependentes dos humores ou da ganância dos especuladores internacionais.

Por outro lado, a exemplo das leis anti-monopolistas criadas no século XX para regular os mercados, considero que também a expansão sem limite dos grandes grupos económicos é contrária ao interesse dos mercados e dos consumidores. A existência de um número restrito de empresas dominantes numa determinada área de mercado, muitas vezes utilizando regras e tarifários idênticos, tem de ser combatida energicamente. No fundo, esta pseudo-concorrência que traz lucros milionários para gestores e grandes accionistas não passa de versões modernas e subtis de monopolismo, que penalizam fortemente os consumidores. Que interessa a estes haver 4 ou 5 empresas num determinado sector de mercado, se utilizam as mesmas regras e preços idênticos? Neste caso, a opção de escolha do consumidor é uma falsa escolha.

Os avisos estão aí, só não vê quem não quer ver. Os mercados, sejam financeiros ou de mercadorias, têm de ser pensados e regulados na óptica da defesa do consumidor e não no interesse das multinacionais e dos especuladores internacionais. A Globalização está no seu início e só tem dois caminhos: ou se reforma rapidamente para responder ao interesse dos cidadãos ou prossegue deslumbrada com a economia de casino e o paradigma chinês e irá colapsar estrondosamente. A economia mundial só poderá globalizar-se de forma duradoura se criar portas de segurança e mecanismos tampão contra a especulação e as abusivas posições dominantes de mercado. Estivemos (estamos?) a um passo de uma crise mundial de consequências imprevisíveis. Pode não haver uma segunda oportunidade.

Mário Lopes, in Jornal Tinta Fresca (Foi mantida a ortografia original)

Mário Lopes é Proprietário/Editor e Diretor do Jornal Tinta Fresca, do concelho de Alcobaça

Vannes - 12º Dia - Parte III



 
Quando a visita guiada ao centro histórico de Vannes acabou, deixou-se o comboio turístico e caminhou-se pela cidade antiga até à Cathedrale Saint Pierre para a visitarmos.

A Cathedrale Saint Pierre domina toda a cidade antiga. Situada dentro de muralhas numa pequena elevação de terreno, vê-se de qualquer ponto da cidade.

Entra-se na cidade medieval de Vannes pela porta da prisão, que é um dos acessos mais antigos à cidade das muralhas. Durante a idade média denominava-se Porta de Saint-Patern, em honra ao bairro sobre o qual se abre. Esta porta possui ao seu lado direito um torreão que serviu outrora de prisão, sendo por isso que na cidade ela é denominada de “Porta da Prisão”, no entanto o seu nome atual é Porte St-Vincent Ferrier, em honra ao padroeiro da cidade.

A partir desta porta, seguimos pelas belas e estreitas ruas que desembocam em pequenos largos, com casas multicoloridas, com vigamentos em madeira, conservando o seu estado de construção medieval em madeira.

As ruas respiram antiguidade, pois a cidade ainda hoje mantem presentes os principais vestígios da sua história: a muralha, os lavadouros, o mercado e os museus, a catedral e numerosos e floridos jardins.

A Catedral é um magnífico e enorme edifício gótico, que encontramos em pleno coração da antiga Vannes. À sua volta as típicas casas bretãs envolvem a toda a volta a magnífica Catedral.

Na sua fachada principal, o portal gótico possui 12 estátuas dos apóstolos. No seu interior encontramos vários túmulos de bispos de Vannes e de mais dois homens santos. Sepultado no coro está o túmulo San Vicente Ferrer, um santo espanhol de Valência, o padroeiro da cidade, que morreu em Vannes, em 1419.

San Vicente Ferrer, também conhecido como o “Anjo do Apocalipse” (que significa anjo da revelação divina ou profeta escolhido por Deus), foi um frade dominicano que depois de ensinar filosofia e teologia em várias cidades espanholas, partiu de Espanha a fim de pregar a fé cristã. Anos mais tarde, em Avignon (França), caiu gravemente doente a ponto de quase falecer. Foi aí que teve uma visão de Cristo, acompanhado de São Domingos e São Francisco, conferindo-lhe a missão de pregar pelo mundo a verdadeira fé, e repentinamente, recuperou a saúde. Partiu então para essa missão, no meio de uma grande crise espiritual na qual estava imersa a sociedade daquela época. Nas suas pregações segundo reza a história, havia sempre multidões e dizia-se que os pecadores sentiam-se movidos ao arrependimento, as pessoas sedentas de perfeição seguiam-no e as inimizades públicas cessavam.

Ainda no interior da Catedral, na Capela da Santíssima encontra-se também sepultado o Beato Pierre René Rogue, também conhecido por Pierre René Vampira (1758-1796), que podemos observar numa tumba envidraçada sob o altar, vendo-se por isso o seu corpo jacente. Este beato que foi beatificado em 1934 foi um sacerdote que nasceu em Vannes, sendo conhecido por sua forte devoção à religião. Foi condenado à morte e guilhotinado durante a Revolução Francesa, por ter ido às escondidas levar a comunhão a um moribundo, enquanto estava proibido de praticar o sacerdócio, sendo traído por denúncia de um homem, a quem sua mãe havia conseguido trabalho e de quem ainda recebia ajuda financeira.

No final da visita à antiga Vannes, ficámos sentados numa esplanada mais uma vez em frente ao porto, sossegadamente a ver o entardecer, antes de se iniciar a partida de bicicleta até Península Conleau, a caminho do parque de campismo.  

O jantar daquele dia foi no belíssimo Camping du Conleau, seguido de uma caminhada refrescante pela quietude do parque.

Fonte: http://wikitravel.org http://atreve-te-a-viver.blogspot.pt/ http://grandessantos.blogspot.pt/