Governos nacionais, cidadãos globais

Nada é mais perigoso para a globalização do que o enorme défice de governação – a disparidade perigosa entre o âmbito nacional da responsabilidade política e a natureza global dos mercados de bens, capitais e muitos serviços – que se acentuou nas últimas décadas. Quando os mercados transcendem a regulamentação nacional, tal como acontece actualmente com a globalização financeira, o resultado traduz-se em deficiências de mercado, em instabilidade e em situações de crise. Mas impor a actividade de regulamentação a sistemas de administração supranacionais, como a Organização Mundial do Comércio ou a Comissão Europeia, poderá resultar em défice democrático e em perda de legitimidade.


Como se poderá colmatar este défice de governação? Uma das opções assenta no restabelecimento do controlo democrático nacional sobre os mercados globais. Trata-se de uma medida difícil com sabor a proteccionismo, mas não é impossível, nem caminha necessariamente no sentido oposto a uma globalização construtiva. Tal como defendo no meu livro intitulado The Globalization Paradox (O Paradoxo da Globalização, ndt.), o funcionamento da economia global iria melhorar caso se alargasse o campo de acção aos governos nacionais, no sentido de manterem a diversidade regulamentar e de reconstruírem os desgastados acordos sociais.


Em vez disso, as elites políticas (e a maioria dos economistas) são a favor de um fortalecimento cuja denominação eufemística é "governação global". De acordo com este ponto de vista, a aplicação de reformas no sentido de melhorar a eficácia do G-20, aumentar a representatividade do Conselho Executivo do Fundo Monetário Internacional, e restringir as normas relativas aos capitais estabelecidas pelo Comité de Basileia sobre Supervisão seria suficiente para proporcionar um suporte institucional seguro para a economia global.


Mas o problema não reside apenas no facto de estas instituições globais se manterem frágeis. Assenta também no facto de serem órgãos intergovernamentais – um conjunto de Estados-membros, em vez de agentes de cidadãos globais. Uma vez que a sua responsabilidade perante os eleitores nacionais é indirecta e incerta, não geram a filiação política – nem, por conseguinte, a legitimidade – exigida pelas instituições verdadeiramente representativas. Na verdade, as dificuldades da União Europeia são reveladoras dos limites da construção da comunidade política transnacional, mesmo entre um conjunto relativamente limitado e semelhante de países.


Em última instância, a responsabilidade circunscreve-se aos parlamentos e executivos nacionais. Durante a crise financeira, foram os governos nacionais que socorreram os bancos e as empresas, recapitalizaram o sistema financeiro, garantiram as dívidas, aliviaram a pressão sobre a liquidez, estimularam a economia e pagaram os subsídios de desemprego e pensões sociais – e assumiram a culpa por tudo o que correu mal. Nas memoráveis palavras do antigo governador do Banco de Inglaterra, Mervyn King, os bancos globais são "internacionais em vida, mas nacionais na morte".


Contudo, talvez haja uma outra via que aceite a autoridade dos governos nacionais, mas que tenha por objectivo a reorientação dos interesses nacionais num sentido mais global. O progresso através desta via exige que os cidadãos "nacionais" comecem a considerar-se cada vez mais como cidadãos "globais", com interesses que se estendem além das fronteiras dos seus Estados. Os governos nacionais têm o dever de responder ?perante os seus cidadãos, pelo menos em princípio. Assim, quanto mais global for o sentido dos interesses destes cidadãos, maior será a responsabilidade global da política nacional.


Isto pode parecer uma utopia, mas já há algum tempo que assistimos a acções desenvolvidas neste sentido. A campanha global para a redução do endividamento dos países pobres foi liderada por organizações não-governamentais, que conseguiram mobilizar jovens dos países ricos para exercer pressão sobre os seus governos.


As empresas multinacionais estão bem cientes da eficácia deste tipo de campanhas de cidadãos, tendo sido obrigadas a aumentar a transparência e a alterar o seu modo de agir relativamente às práticas de trabalho em todo o mundo. Alguns governos perseguiram líderes políticos estrangeiros que cometeram crimes contra os direitos humanos, recebendo um apoio significativo por parte dos seus cidadãos. Nancy Birdsall, presidente do Centro para o Desenvolvimento Global, cita o exemplo de um cidadão ganês que testemunhou perante o Congresso dos EUA, na esperança de convencer as autoridades norte-americanas a pressionar o Banco Mundial no sentido de alterar a sua posição relativamente às taxas de utilização em África.


Estes esforços, de perspectiva ascendente, para "globalizar" os governos nacionais têm melhores condições para afectar as políticas ambientais, especialmente as que visam atenuar as alterações climáticas – que são o problema global de solução mais difícil. Curiosamente, algumas das mais importantes iniciativas para reduzir as emissões de gases com efeito de estufa e promover o crescimento verde são fruto de pressões locais.


Andrew Steer, presidente do World Resources Institute, salienta que mais de 50 países em desenvolvimento estão actualmente a implementar políticas onerosas para reduzir as alterações climáticas. Do ponto de vista do interesse nacional, esta acção não faz qualquer sentido, dada a natureza global do problema.


Algumas destas políticas são motivadas pelo desejo de conseguir uma vantagem competitiva, como é o caso do apoio às indústrias verdes por parte da China. Mas, se os eleitores possuírem uma consciência global e ambiental, uma boa política climática poderá também ser uma boa política.


Consideremos, por exemplo, a Califórnia que, no início deste ano, lançou um sistema de limitação e comércio, que, até 2020, visa reduzir as emissões de carbono para os níveis registados em 1990. Embora não se tenha verificado uma acção global em matéria de fixação de valores-limite para as emissões, alguns grupos ambientalistas e cidadãos preocupados exerceram pressão para que a medida fosse aceite, sobrepondo-se à oposição de grupos empresariais e, em 2006, o então governador republicano do estado, Arnold Schwarzenegger, aprovou a lei. Caso esta medida se revele bem-sucedida e se mantenha popular, poderá tornar-se um modelo para todo o país.


Os dados das sondagens globais de opinião, como a World Values ??Survey, indicam que há ainda um longo caminho a percorrer: a auto-percepção de cidadania global tem tendência a permanecer 5 a 20 pontos percentuais abaixo da cidadania nacional. Mas a diferença é menor no que diz respeito aos jovens, às pessoas mais instruídas e às classes profissionais. Aqueles que consideram estar no topo da estrutura de classe têm uma consciência global significativamente maior do que aqueles que se consideram parte integrante das classes mais baixas.


É claro que a "cidadania global" será sempre uma metáfora, porque nunca existirá uma comunidade política mundial gerida por um governo mundial. Mas quanto mais pensarmos em nós mesmos como cidadãos globais e, nessa qualidade, expressarmos as nossas preferências aos respectivos governos, menos teremos de perseguir a quimera da governação global.
 
Dani Rodrik, in Público de 13/03/2013 (Foi mantida a ortografia original)

Por Dani Rodrik, professor de Economia Política Internacional na Universidade de Harvard, é autor de The Globalization Paradox: Democracy and the Future of the World Economy (O Paradoxo da Globalização: A Democracia e o Futuro da Economia Mundial)

Tradução: Teresa Bettencourt/Project Syndicate
 

Outra tradução em: https://conteudoclippingmp.planejamento.gov.br/cadastros/noticias/2013/3/14/governos-nacionais-cidadaos-globais





Belo texto!... Mas quais as consequências de nos vermos como cidadãos globais? O tecnicismo e o cientificismo em que estamos mergulhados, não tenderá cada vez mais a um processo de desumanização das relações humanas? Vermo-nos como cidadãos globais não levará ao perigo da construção de uma sociedade com perda de identidade cultural? E se a todas estas perguntas, juntarmos o problema de conseguirmos arranjar reais mecanismos de justiça para a punição exemplar de crimes e abusos de todo o tipo?


O que será do futuro? Só o futuro o dirá!...


Acerca do texto aqui publicado, devo também acrescentar, que “Um dos grandes mandamentos da ciência é “desconfiar das afirmações das sumidades” (os cientistas, na sua qualidade de primatas, por conseguinte propensos a hierarquias de domínio, nem sempre lhe obedecem), pois muitas dessas afirmações revelam-se tristemente erradas. As sumidades têm de provar as suas asserções como outra pessoa qualquer. Esta independência da ciência, a sua incapacidade ocasional de aceitar a sabedoria convencional, torna-a perigosa para doutrinas menos autocríticas ou com pretensões de certeza.”

 
Carl Sagan, in “Um Mundo Infestado de Demónios”, paginas 50 e 51.


 
 

Habemus Papam, Habemus duo Pap

 
«Estamos a avançar para uma ditadura de relativismo que não reconhece nada como certo e que tem como objetivo central o próprio ego e os próprios desejos».
Joseph Ratzinger, in homilia que dominou a missa «Pro eligendo Romano Pontifice».
 

A renúncia do Papa Bento XVI trouxe abalo e desilusão a uns, surpresa, e ainda compreensão e admiração a outros. Para mim foi um ato de grande humildade e generosidade.
Uma certeza porém temos, estamos a viver uma época muito rica em acontecimentos, e a renúncia de Bento XVI (o primeiro Papa a renunciar nos últimos 600 anos), que continua como Papa emérito, e a eleição do novo Papa Francisco I, faz-nos sentir que ficámos mais ricos, por termos a sorte em podermos assistir a um acontecimento como este, sem que tivéssemos que perder um deles para sempre.
Nunca estivemos tão acompanhados!
Como nos diz João Pereira Coutinho, in Correio da Manhã – 15/03, “Quando Ratzinger foi eleito, ‘Bento’ era uma homenagem a Bento XV, que enfrentou a 1ª Guerra; mas também a S. Bento, que ajudou a apanhar os cacos da civilização depois das invasões bárbaras. A visão de Ratzinger era uma visão de resistência ante a ‘ditadura do relativismo’.
O novo ‘Francisco’ evoca Francisco de Assis e a sua postura despojada e benemérita. Mas é igualmente uma referência a Francisco Xavier, o grande evangelizador, o que prova que o novo Papa está atento ao principal desafio da Igreja: não perder uma Europa ‘descristianizada’; não perder a (sua) América Latina para as congéneres evangélicas; e não perder os católicos de África (e da China) com as perseguições lá praticadas.
Se a tudo isto o novo Papa juntar mão firme no governo da Cúria e punição exemplar para crimes ou abusos (ser jesuíta é óptimo sinal), a expressão ‘temos Papa’ poderá ser usada com dupla propriedade.”  (Texto escrito com a antiga grafia)
Fonte: http://www.tsf.pt/ http://www.cmjornal.xl.pt/

A Harmonia dos Mundos


Carl Sagan inicia o terceiro episódio da série mostrando as diferenças entre a astrologia e a astronomia, lamentando a presença massiva da astrologia nos jornais, frente à dificuldade de encontrar qualquer coluna sobre astronomia.

Fala-nos dos nossos ancestrais, que num movimento ascendente para a contemplação dos mistérios celestiais, sempre observaram as sucessões dos dias e das noites numa esperança de imortalidade. Mil anos depois os Anasazi (um antigo povo indígena norte-americano que desapareceu completamente antes da chegada dos europeus à América) construíram um observatório onde faziam observações dos movimentos solares, aprendendo a prever as mudanças das estações, com uma precisão que é um verdadeiro triunfo da inteligência humana.

Traça-nos assim o percurso da humanidade na observação dos corpos celestes e na descoberta das leis que os regem, até à superação do modelo geocêntrico promovida por Copérnico, Tycho Brahe e Kepler.

Em todo o mundo, os nossos antepassados de todas as culturas tiveram conhecimentos próprios de astronomia. As suas vidas disso muito dependiam. Mas a caminhada humana desde os mais remotos astrónomos aos modernos exploradores do Cosmos, derivou numa pseudociência chamada astrologia.

O último astrólogo científico foi também o primeiro astrónomo moderno: Johannes Kepler. Kepler lutou pela busca de uma harmonia nos céus e deu um passo fundamental para nos conduzir à era científica. O segredo que conduziu Kepler foi um respeito descomprometido pela observação dos céus, mesmo quando, agonizante, o confrontaram com as mais enraizadas crenças que acarinhava.

Os profundos conhecimentos de Kepler ensinaram-nos como a Lua e os planetas se movem nas respetivas órbitas e, mais recentemente, como viajar para eles.



Fonte: http://www.youtube.com/watch?v=N9C0MpJvymU&list=PL37DC1C0231D2BA61&index=4

Carnac - 12º Dia




No dia seguinte ao da chegada a Le Croisic, acordou mais ensolarado e fomos até ao porto para um melhor reconhecimento do lugar mais pitoresco da cidade.


Le Croisic fica situada numa pequena península, La Baule, que faz o acabamento sul da entrada de uma baia de águas brandas, a Baia de Pouliguen, que faz com que os portos daquela região sejam de fácil acesso por mar. O outro lado da baia é uma restinga que faz o “fecho” da baia.


O pequeno e belo porto de Le Croisic protege a cidade do oceano, circulando em torno do canto norte de um baixo promontório. É um lugar muito atraente para ficar de La Baule. É um verdadeiro prazer observar os barcos de pesca que ainda navegam a partir deste porto, observando-se o percurso de navegação desde a boca fina da baía até à sua chegada. À entrada do porto, há um mercado de peixe moderno, onde se pode assistir à exposição do pescado capturado no dia sendo leiloado.

Os montes de ambos os lados do porto, Mont Lenigo e Mont Esprit, não são naturais, tendo sido formados a partir do lastro deixado pelos navios do comércio do sal.

Para norte, todo o litoral é rochoso sendo conhecido como Costa Grande, onde existem uma série de parques de campismo de grande qualidade e um Oceanógrafo. Na pequena povoação de Saint-Marc-sur-Mer, encontra-se o familiar Hotel de la Plage, onde em 1953, Jacques Tati filmou grande parte do filme “Les Vacances deMonsieur Hulot”, uma espécie de sátira ao turista. 

 
Seguimos depois rumo a Carnac e Vannes, onde iriamos pernoitar. Chegámos cedo a Carnac e fomos direitos à zona dos alinhamentos, que é a principal atração do lugar. Uma das curiosidades desta zona é que esses alinhamentos se estendem por vários quilómetros em volta de Carnac, constituindo um enorme conjunto de menires conhecido como Rochas de Carnac.

A Bretanha é por si só, o lar de muitos monumentos megalíticos (os menires, famosos entre nós por causa das historias do Astérix), que estão espalhados por toda a região. No entanto é perto de Carnac que se encontram os maiores alinhamentos. O porquê destes monumentos terem sido ali colocados em tão grande quantidade ainda é desconhecida, e muitos habitantes locais são relutantes em especular sobre o assunto, ou seja, não adianta perguntar por lá que ninguém sabe.

Carnac (do celta cairn ou carn, que significa morrinho ou elevação) é habitada há mais de 450 mil anos. O local de alinhamentos de menires, de dólmens e de alamedas cobertas, (alguns deles associados ao culto dos mortos), estende-se por mais de quatro quilómetros e conta com cerca de 4 mil megálitos, constituindo o maior conjunto deste tipo do mundo.


As Rochas de Carnac foram erguidas no período pré-histórico por comunidades sedentarizadas, entre o quinto e o segundo milénio a.C.. Os megálitos foram erguidos durante o período Neolítico,que durou de 4500 aC até 2000 aC. A data precisa das Rochas de Carnac é difícil de determinar, pois como material datável pouco foi encontrado debaixo delas.

Existem dois grupos principais de alinhamentos de pedra em Carnac, que são conhecidos como o Menec e alinhamentos Kermario. Alinhamentos ainda menores estão espalhados pela área, incluindo o Kerlescan e o Menec Petit.

Os alinhamentos Menec são 12 linhas convergentes de menires de alongamento com mais de 1 quilómetro, com os restos de um círculo de pedra em cada extremidade. As pedras maiores, com cerca de 4 metros de altura, encontram-se na extremidade mais larga ocidental, tornando-se menores ao longo do comprimento do alinhamento, atingindo cerca de 60 cm de altura. No extremo leste crescem também em altura.

Estas comunidades aproveitaram a presença na região de grande quantidade de granito existente no subsolo, propício à construção de grandes blocos, (o maior deles todos, o gigante do Manio), deixando para a posteridade estes magníficos testemunhos da sua ancestral existência e religiosidade.

Talvez jamais saibamos quais eram os seus objetivos exatos, mas eles são claramente expressões de um sistema de crença, assinalando as estações e os movimentos cíclicos do Sol, da Lua e das estrelas.

Fonte: http://france-for-visitors.com http://maps.google.pt/ http://pt.wikipedia.org/ http://www.france.fr/pt/ http://www.sacred-destinations.com/

 

Saint-Nazaire e Le Croisic - 11º Dia - Parte II


Deixámos Pornic a caminho de Saint-Nazaire onde iríamos passar para o outro lado do estuário do rio Loire. A cidade situada a sul de "la Brière”, o segundo maior pântano na França, tem um grande porto, na margem direita do estuário. Dada a sua localização, Saint-Nazaire tem uma longa tradição de pesca e construção naval.
Os arqueólogos acreditam que Saint-Nazaire é construído sobre os restos de “Corbilo”, uma antiga cidade gaulesa povoada pela tribo Namnetes, que de acordo com o navegador grego Pytheas, foi a segunda maior cidade gaulesa, depois de “Massilia”, a atual Marselha.
Em Saint-Nazaire e antes de passarmos a sua comprida e elegante ponte, apanhámos a hora de ponta e com ela tivemos que aguentar algum tempo numa imensa fila de automóveis que atravessava a passo de caracol o largo estuário.
St. Nazaire é uma cidade de trabalho de estivadores e metalúrgicos, sendo por isso uma cidade que abriga muitos imigrantes de várias etnias. Foi precisamente sobre a ponte em andamento lento, que um carro branco no mesmo sentido que nós, mas um pouco mais atrás, se fartava de apitar…, afinal era uma matrícula portuguesa (a segunda que vimos) que seguia só com o condutor, que envergava uma T’shirt com a bandeira portuguesa vestida, literalmente um bom compatriota!...
Não fosse a complicação em plena ponte, aquele homem teria tido o costumeiro comprimento merecido e o abraço que nunca se dá a desconhecidos na sua própria terra… Um emigrante é sempre uma pessoa dividida, entre a terra onde ganha a vida e a terra de saudade onde nasceu e onde tem os seus familiares. Será a saudade que o faz sentir ali tão português? Não deveriam ser os do seu país que lhes deveriam fazer a festa? Afinal não são as remessas dos emigrantes que têm um “peso económico” muito maior do que aquilo que se pensa? Mas como não somos de todo políticos, lá seguimos depois de simpaticamente acenarmos para agradecer a festa.  
Não parámos em Saint-Nazaire e seguimos para oeste pela beira-mar até Le Croisic, onde iríamos pernoitar.
Para se ter uma ideia de como é Le Croisic, pode dizer-se que tudo parece começar no seu porto, que aliás levou a cidade a grande proeminência no séc. XVI. É a partir dali que o sal das zonas de sapal próximas, foi sendo exportado e para ali que os comerciantes do Norte da Europa traziam madeira, ferro e carvão.
Graças a esse comércio e à pesca, que Le Croisic gozou de autonomia administrativa e financeira relativa durante muitos anos. Foi com esses ganhos que a cidade pode construir a sua bela igreja e os dois molhes no extremo do porto. No entanto, o seu período afortunado declinou no séc. XVIII, mas voltou a subir novamente no séc. XIX com o advento do turismo, da pesca da sardinha que fez abrir fábricas de conservas.
Hoje embora Le Croisic seja mais conhecida pela sua indústria de pesca e do marisco, tem um porto muito típico e atraente, sendo por isso uma zona turística por excelência e um dos resorts turísticos de primeira da Bretanha. A cidade é uma base que facilita a exploração de La Baule na Península de Guérande que oferece praias selvagens e acidentados passeios costeiros.
A noite do 11º dia foi passada na AS de Le Croisic, situada em frente à “Marie”, um lugar de pernoita absolutamente tranquilo.

Fonte: http://en.wikipedia.org http://www.brittanytourism.com www.espacoerrante.blogspot.com/

Nantes e Pornic - 11º Dia - Parte I




 
Na noite do 10º dia de viagem e depois da visita ao Grand Park de Puy du Fou, ainda dormimos na AC do lugar, e logo que acordámos rumámos a Nantes, para depois nos dirigirmo-nos mais uma vez para o litoral.


Porta de entrada do vale do Loire e da Bretanha, Nantes é reconhecida como a capital europeia do bem-estar.

Situada às margens do rio Loire, perto da costa do Atlântico, Nantes é uma cidade “verde”, por impedir o trânsito no seu interior, só deixando circular dentro da cidade bicicletas e transportes públicos elétricos. É a sexta maior cidade da França e em 2004, a revista Time Magazine classificou Nantes como "a cidade mais habitável na Europa", tendo adquirido este ano (2013) o título de Capital Verde Europeia.

Os ventos vindos de oeste trazem para Nantes o perfume do iodo e sal do Atlântico próximo. O rio Loire navegável desde a costa oeste ilumina a cidade, e as suas margens propiciam a existência de muitas esplanadas e cafés.

A cidade guarda ainda as aventuras marítimas do séc. XVIII, vendo-se ainda alguns barcos dessa época de três mastros, misturando a sua história antiga com a louca modernidade cultural...

Embora Nantes tenha muito que ver e visitar, optamos por uma passagem ligeira pela cidade, a caminho de outras paragens mais marítimas. Assim Nantes, capital da Bretanha foi uma cidade somente de passagem e dela se recorda sobretudo a modernidade e as belas varandas naturais, nas margens do Loire.

Pornic é uma típica terra de pescadores para onde nos dirigimos a partir de Nantes e que sem qualquer dúvida justificou a visita, mas como ainda era cedo preferimos nos retermos ali a pernoitar.

Pornic, é a verdadeira joia da Costa Jade e é o mais meridional dos portos da Bretanha Atlântica. Um dos cantos os mais encantadores de Pornic é sem dúvida o seu velho porto. Dominado pela cidade medieval e o Castelo de Gilles de Rais, é particularmente animado por uns vinte arrastões que vêm ali abrigar-se.

O Porto de Pornic é frequentado a partir da Antiguidade. Primeiro como refúgio de corsários, sendo mais um porto de partida dos pescadores para a Terra Nova, desde o séc. XVI ao séc. XX, que deixavam a costa europeia em cada ano para irem pescar bacalhau nos Grandes Bancos da Terra Nova. Seguidamente acolheu numerosos navios comerciais provenientes dos portos britânicos, holandeses e escandinavos.

Pornic, que se estende sobre a vasta baía de Bourgneuf, é um sítio ideal para a vela e a prática de regatas e além do porto velho, possui ainda mais dois portos: o Porto de Gourmalon que pode acolher cerca de 350 embarcações e o porto de águas profundas de La Noëveillard, que pode receber cerca de 900 embarcações.

No cume do penhasco, vale a pena percorrer a velha cidade ao encanto medieval e descobrir, sobretudo os dias de mercado, os mercados que datam de 1609. No casario típico, admiram os tetos vermelhos e azuis, mistura da telha e da ardósia, e as escadas que ligam a alta cidade ao porto de pesca que constituem um labirinto particularmente pitoresco.

Mas não podemos esquecer que estamos no Vale do Loire, que é sinónimo de casas senhoriais encantadoras. E Pornic, tal como Nantes, não são exceção à regra, e mostram-nos também os seus belíssimos exemplares.

O Châteaux de Pornic, é um belíssimo castelo, também conhecido como o "Castelo do Barba Azul", porque pertenceu a Gilles de Rais.

Gilles de Rais, ou Gilles de Retz (1404 - 1440), foi um nobre e aguerrido soldado francês que lutou em diversas batalhas ao lado de Joana D'Arc contra os ingleses. Embora fosse em criança muito dócil, após a morte de sua mãe e, posteriormente, a trágica morte de seu pai, foi criado tal como o seu irmão, pelo avô materno, Jean de Craon, que ensinou aos garotos o narcisismo, a soberba, o poder, o orgulho, moldando negativamente a personalidade de Gilles. Gilles de Rais o senhor do castelo no séc. XV, ficou conhecido por Barba Azul por ser acusado e condenado por torturar e estuprar um grande número de crianças, sendo considerado o precursor do assassínio em série.

Localizado numa pequena encosta rochosa na costa norte do porto de Pornic, o castelo tem sido um símbolo da cidade, mas outrora foi uma espécie de fortaleza que fazia a defesa medieval do antigo porto. 

Na periferia da cidade, na estrada que liga Pornic às cidades de Sainte-Marie e de Clion, é um prazer descobrir os megálitos que atestam de uma presença humana extremamente antiga em Pornic.

Fonte: http://ec.europa.eu/ http://pt.franceguide.com/ http://fr.wikipedia.org/

A morte como instante de vida

A vida de hoje já não é a de ontem. Então a vida não é mais do que uma caminhada para a morte.

Os antigos diziam que a filosofia era uma longa meditação sobre a morte; os modernos quiseram afastá-la das suas preocupações; nós, contemporâneos, procuramos bani-la de nosso mundo. Mas a morte acha-se profundamente ligada à vida, colocando em causa o sentido da própria existência, propondo ao homem o desafio de pensar a sua própria condição.
Mas hoje em dia nós vivemos a morte de forma paradoxal. De um lado vivemos uma certa banalização da morte, e fala-se de morte o tempo todo, parecendo até que a morte para nós é uma coisa banal.
Ouvimos então falar permanentemente de morte, nos jornais, nas televisões... São as notícias de guerras, são as mortes de personalidades do mundo da política, do mundo do espetáculo, das artes… São as notícias de cataclismos, tsunamis… Enfim, fala-se permanentemente da morte!...
Cabe então a pergunta: Por é que a morte é sempre vista como uma espécie de escândalo? Por que é que esse acontecimento banal, provoca ao mesmo tempo horror e curiosidade?
Neste Café Filosófico, a filósofa e professora universitária Scarlett Marton, dá-nos o seu parecer sobre a forma como devemos encarar a morte nos nossos dias.
Scarlett Marton é professora titular de filosofia contemporânea da Universidade de São Paulo (USP) e é considerada uma das maiores conhecedoras brasileiras do filósofo alemão Friedrich Nietzsche. Publicou trabalhos na Alemanha, Áustria, França, Espanha, Estados Unidos, Venezuela, Colômbia, Bolívia, Argentina e Chile.

Fonte: http://www.youtube.com/watch?v=A46dfe8B5Us ; http://pt.wikipedia.org/

A crise e as crianças


 
Não é novidade para ninguém que a crise económica, financeira ou social afecta, em primeiro lugar, as populações mais vulneráveis. Nestas, incluem-se as crianças, em especial as que pertencem a meios desfavorecidos ou que têm alguma forma de deficiência ou handicap.

Acresce que estes “meios desfavorecidos” não são apenas os tradicionais, mas abrangem hoje muitas famílias anteriormente pertencentes a uma classe social com algum (mesmo que pequeno) desafogo e que, agora, estão estranguladas pelo desemprego, cortes sociais, aumentos incomportáveis da carga fiscal e das múltiplas falências.

Convém, no entanto, ter presentes três factos: um, é que sempre houve, ao longo da História, períodos de crise. Portugal, durante a II Grande Guerra, por exemplo, apesar de não ter estado directamente envolvido no conflito, passou tempos muito difíceis, com racionamentos de leite e de pão e com todo o tipo de restrições ao bem-estar. Segundo facto: a actual crise “apanha” a população portuguesa num estádio de desenvolvimento muito bom, com capacidade, portanto, de lhe fazer face. Mesmo com a redução do poder de compra ou de algumas benesses, e perspectivando-se um certo grau de empobrecimento geral, iremos, na pior das hipóteses, ficar muito acima do nível de vida da esmagadora maioria da população mundial. Terceiro facto: as crises servem também para reflexão, definição de novos paradigmas, para mudança e crescimento, e para nos libertarmos de erros e falhas passadas, de modo a que, pelo menos estes, não se voltem a repetir.

Recusando qualquer argumento arrogante e insuportável, do tipo “aguenta, aguenta”, e criticando, sem cerimónias, a insensibilidade social deste Governo, que, para mim, tem uma agenda política muito bem definida, para lá de uma incompetência igualmente explícita, estou, de qualquer forma, em crer que a actual crise poderá ser uma oportunidade para as famílias repensarem as suas prioridades, designadamente os seus hábitos de consumo, e, também, para evitarem uma coisa terrível: o desperdício.

Por outro lado, pode servir para ensinar as crianças a distinguir entre o que é essencial e o que é acessório: por exemplo, uma ida a um parque colher folhas secas, fazer colagens ou apanhar pedras e pintar, ou ir a uma praia apanhar conchas, podem ser actividades de “custo zero” que dão prazer e conhecimento, entretenimento e gozo e que não se compram. Ou seja, têm um grande valor, mas um pequeno preço.

Com excepção para as famílias em situações-limite – e que são cada vez mais –, que poderão vir a passar por dificuldades extremas e carências em bens essenciais, a crise pode ser uma forma para reflectir sobre o que se gasta em consumos desnecessários e permitir às crianças valorizar o que têm e perceber que não são mais felizes por terem mais roupa ou brinquedos.

Vale também a pena explicar aos nossos filhos que a crise resulta, em parte, da ganância do “quero tudo, já!”, que atingiu muitas pessoas, levando-as a pensar que eram deuses a quem tudo era devido, e que desembocou numa escalada de consumo de bens apenas para ostentar um determinado estilo de vida ou mero show-off. Também será uma boa oportunidade (dependendo da idade, claro) para explicar, com verdade, mas sem entrar em pormenores ou áreas que as crianças não compreendam, as causas e as consequências da crise e explicar a interdependência dos vários fenómenos sociais e políticos. E de como, se não lutarem por uma sociedade democrática e equitativa, de que são exemplo as escandinavas, irão ter um país empobrecido, desigual, iníquo e injusto.

Mas se, por um lado, é importante que as crianças percebam que os pais têm menos poder de compra, por outro, também devem sentir que isso não vai afectar o seu bem-estar ou as suas necessidades básicas. O impacte psicológico da crise será maior se os pais se lamuriarem e vitimizarem perante as crianças – estas têm de sentir que têm pais que conduzem o barco e que os protegem e promovem segurança.

Encaremos a crise com lucidez, esperança e vontade de a vencer. O derrotismo, a desilusão e o pessimismo só servirão para aumentar a nossa infelicidade. Para isso, já basta a própria crise…

Mário Cordeiro, in Púbico de  21/02/2013 (Foi mantida a ortografia original)
O autor é médico e professor de Pediatria.