O mal primordial: o orgulho nosso de cada dia


 “Não era a vaidade que a atraia para o espelho, mas o espanto de descobrir-se.”

Milan Kundera

A vaidade é um sentimento de todos nós. É um sentimento, mais escondido nuns e mais evidente noutros, mas é comum a todos, e é ela que na maioria das vezes, nos impulsiona para a conquista da nossa vida ou mesmo a do mundo. Não quero a última, mas quero sem dúvida a primeira!...


 

Sonho que sou a Poetisa eleita,
Aquela que diz tudo e tudo sabe,
Que tem a inspiração pura e perfeita
Que reúne num verso a imensidade!
Sonho que um verso meu tem claridade
Para encher todo o mundo! E que deleita
Mesmo aqueles que morrem de saudade!
Mesmo os de alma profunda e insatisfeita
  Sonho que sou Alguém cá neste mundo...
Aquela de saber vasto e profundo,
Aos pés de quem a terra anda curvada!
 E quando mais no céu eu vou sonhando,
  E quando mais no alto ando voando,
  Acordo do meu sonho... E não sou nada!
                             
Florbela Espanca, Vaidade, in Sonetos

 
Um dia, o mais belo arcanjo, Lúcifer, disse Eu, em vez de Nós. Surgia o ser individual que se destacava da criação e buscava um lugar de consciência de si, onde antes só havia o coletivo da criação. Iniciava-se a história.
 
Na mitologia religiosa, o mensageiro do Mal preside ao pecado original da soberba e da vaidade.
 
O mundo contemporâneo rebatizou a soberba como autoestima e a necessidade de se amar acima de tudo, como repete o mantra de quase toda a literatura que vende felicidade em drageas nas bancas dos aeroportos.
 
A humildade, o recato e a modéstia, passaram de virtudes a deficiências de lítio.
 
Este encontro de mais um Café Filosófico, trata do mais original e primordial de todos os pecados, o orgulho, capaz de seduzir a todos, especialmente aqueles que se consideram humílimos.
 
De atributo maléfico, o orgulho virou parte do mundo burguês contemporâneo. A virtude/defeito erigiu estátuas, criou biografias e deleites pessoais. Perdida a inocência/humildade original, resta o anseio pelo Nós, rejeitado pelo pai da mentira, ou seja, pelo pai de todos nós.
 
Filhos legítimos do individualismo orgulhoso, lutamos pela adoção de um mundo humilde e voltado ao outro, ou seja, o mundo oposto a todos nós.
 
Apátridas, vagamos fixados na miragem do humilde modelo criado por nós, que insiste em estar além do espelho borgiano. Parte deste Aleph pode ser encontrado ao destrinçar-se o fascinante mundo do orgulho.
 
Esta é mais uma excelente palestra de Leandro Karnal, historiador, doutor em História Social pela USP, professor da UNICAMP e autor de diversos livros.
 

Fonte: http://www.youtube.com/watch?v=cpxVd5whW9U http://www.citador.pt/
http://www.cpflcultura.com.br/evento/cafe-filosofico-cpfl-o-mal-primordial-o-orgulho-nosso-de-cada-dia-com-leandro-karnal/

Nenhum comentário: