A Reconciliação de Pedro e Paulo


"É minha firme convicção que a minha saída contribuirá para reforçar a sua liderança e a coesão da equipa governativa."

Vítor Gaspar
 

Imagem retirada do Diário de Noticias de 2013-07-04 
 


São tantos os episódios rocambolescos do recente divórcio da coligação governamental, que é difícil escolher o mais caricato ou absurdo.
Depois de alguns dias passados entre as desavenças de Pedro e Paulo, Cavaco diz Stop e obriga a uma forçada reconciliação, e o tão esperado divórcio vai por água-a-baixo. Para quando uma solução cabal para os problemas de Portugal?  
 
De todos os artigos de jornal lidos durante estes dias conturbados, escolhi o Editorial do Público de 4 de Julho, por ser talvez o mais assertivo de todos, e aquele que melhor descreve os últimos passos e descompassos de Paulo e Pedro, na tentativa de refazer um novo acordo de casamento, agora sem dúvida nenhuma, a contragosto. Será que o novo arranjo, agora mais do que nunca de conveniência vai durar?
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Editorial
O Governo ainda mexe. Mas não passa de um cadáver adiado. Pedro Passos Coelho pode ter obrigado Paulo Portas a fazer marcha atrás e ter ganho um braço-de-ferro político insólito e sem precedente na nossa história democrática. Mas qual é a consistência política do Governo que lidera? Paulo Portas declarou que a sua demissão era "irrevogável". Passos Coelho nem sequer se dignou aceitá-la (um gesto muito pouco democrático) e culpou publicamente o parceiro de coligação pela crise. Em consequência, Paulo Portas recuou, manteve os seus ministros no Governo e vai "renegociar" o acordo de coligação. Mas irá fazê-lo em posição de enorme fragilidade. Acima de tudo, Paulo Portas perdeu a face.
 
O abismo que ontem de manhã se abriu nos mercados e nas bolsas foi apenas um aviso sobre os custos que poderiam resultar da enorme irresponsabilidade dos líderes do PSD e do CDS. Os quais vão agora tentar manter uma coligação onde estão a contragosto, em nome dessa entidade sacrossanta que é a estabilidade política. O recuo de Portas surge, é melhor não ter ilusões, depois de a Europa e Berlim terem explicado que esse tipo de brincadeiras não é autorizado. A ida de Passos Coelho, ontem, a Berlim, quando tinha a coligação a desmoronar-se em Lisboa, também quis dizer isso. Ele foi mostrar ao exterior que tudo estava sob controlo (apesar de tudo, fez bem em querer manter as aparências, embora fosse uma mentira colossal) e trouxe do exterior o voto de confiança para que nada mexesse. Portas, que no congresso de Viseu, em 2011, antes de ser governo, tanto clamava contra o "protectorado" europeu, acabou por ser vítima do "protectorado".
 
Mas a estabilidade tem as costas largas. E o mais importante não é saber se é possível o Governo manter-se a qualquer preço, mas se faz sentido o Governo manter-se. Ora se a estabilidade é o único argumento invocável para manter este triste casamento de conveniência, isso significa que o cimento político que o mantinha deixou de existir. Por isso, o Governo está virtualmente morto. Os seus líderes suicidaram-se. E não é só em nome da tal estabilidade que tocaram a reunir-se e esqueceram as "pequenas divergências" (nas palavras de Passos Coelho) que desencadearam um espectáculo público degradante. É também para evitar um terramoto eleitoral.
 
Entre a birra de Portas e o raspanete de Passos, este Governo degradou a imagem das instituições democráticas como nenhum outro. E a pergunta é: este Governo deve continuar? É verdade que, se houver acordo, o Presidente deixa de ter margem para dissolver o Parlamento. Mas se a pergunta é colocada em nome da estabilidade política, a resposta só pode ser um claríssimo não. Pela simples razão que o Governo perdeu a autoridade e a legitimidade. E a estabilidade requer um governo legitimado e com autoridade. A vergonha tem limites. E o Governo de Portugal tornou-se uma vergonha ambulante. Se continuar, não será mais do que uma fonte de instabilidade.

Público 2013-07-04

Ver e ouvir mais em:  


Crise no Governo: Portugueses descrentes com os políticos: http://www.tvi.iol.pt/video/13910043

A opinião de José Pacheco Pereira (vale a pena ouvir): Vídeo Estaremos a assistir a um reality show - Público

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