A tentativa de se fazer um
cozinhado tripartido de "salvação nacional" chegou ao fim. Caldo entornado,
trabalho dobrado. E agora senhor Presidente? Manter o leme virado para a mesma
direção ou dar um novo rumo?
"Sem
acordo”, disse Cavaco Silva a 10 de Julho, “encontrar-se-ão outras soluções no
quadro do nosso sistema jurídico-constitucional” — “existirão sempre soluções
para a atual crise política”.
Ainda bem senhor
Presidente!...
A radionovela continua…
Dia 21-07-2013: O Presidente falou aos portugueses. Infelizmente vamos manter o leme virado na mesma direção. Pena.
A radionovela continua…
Dia 21-07-2013: O Presidente falou aos portugueses. Infelizmente vamos manter o leme virado na mesma direção. Pena.
Contrapoder 19-07-2013
Segue-se uma boa visão
sobre os acontecimentos políticos, que deram origem ao quadrado da crise.
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Comentadores
esforçaram-se, sem sucesso, por estabelecer um nexo entre os acontecimentos da
crise dos últimos dias. As metáforas da infância invadiram o espaço mediático
com os actores, menorizados, a serem tratados de miúdos, fedelhos, garotos.
A sucessão de acontecimentos dos últimos dias e a eclosão de uma crise dentro da crise deixaram a sociedade portuguesa estupefacta e incrédula. Comentadores e analistas esforçaram-se, sem sucesso, por estabelecer um nexo entre acontecimentos, identificar uma racionalidade por detrás das decisões, um fim último que permitisse compreender as tácticas. Parecia impossível uma leitura que obedecesse à lógica e desse sentido ao drama que se desenrolava na esfera política. Perante esta impossibilidade, as metáforas da infância invadiram o espaço mediático com os actores, menorizados, a serem tratados de miúdos, fedelhos, garotos e os seus comportamentos considerados amuos, birras e criancices.
Este discurso, que depressa se generalizou, é
revelador da capitulação perante a irracionalidade e a irresponsabilidade do
exercício do poder por aqueles que o receberam, por delegação, através do voto.
É certo que os valores do mundo adulto que servem de
referência à menorização dos adultos através da metáfora da infância parece
estar em vias de extinção, mesmo noutras paragens. Será que o comportamento de
instâncias internacionais, como o FMI, que reconhecem erros nos programas de
ajustamento, mas continuam diligentemente a aplicar a mesma receita,
indiferentes aos seus efeitos sobre os países, é exemplo de responsabilidade e
racionalidade? Será que o Conselho Europeu que assiste passivamente ao
desmoronamento de países que supostamente deviam ocupar um lugar entre iguais,
para não perder a face perante os poderes que o dominam, dá um exemplo de
decisões racionais e responsáveis?
E quando todas estas instâncias, nacionais e
internacionais, atiram culpas para cima umas das outras dos maus resultados das
suas decisões, isso é um comportamento responsável? E o que dizer do sucessivo
adiamento da reforma da união bancária, que surge como a melhor forma de
proteger os cidadãos e os Estados dos erros do sector, para agradar a um só
país, sem dúvida preocupado em evitar que se tornem conhecidos os erros dos
seus próprios bancos e a sua responsabilidade numa crise que foi sempre
apresentada como culpa dos outros?
Em Portugal, a recente crise foi desencadeada pela
demissão de um ministro, de reconhecido mérito entre os seus pares e abençoado
pelos credores que afirmou alto e bom som que era incapaz de prosseguir a
agenda de que tinha sido incumbido. Ao cabo de dois anos de aplicação de um
programa, que mais parecia destinado a castigar o país e expurgar a sociedade
dos seus vícios, veio reconhecer que errara nos cálculos, como já muita gente
tinha dito antes, falhara os objectivos e não tinha condições para terminar
esse mandato.
Não questionou os pressupostos, nem a racionalidade
moralista que o inspirou, antes apontou a fraqueza da liderança política e a
sua incapacidade de travar o impacto, no interior do governo, da devastação
social e económica do país. No meio da agitação e da intriga que se sucedeu a
esta demissão passou despercebido o juízo sobre o comportamento de um agente
político que, não tendo perdido a fé, nem a sua opinião sobre o país que nunca
o elegeu, como fazia questão de sublinhar, voltou calmamente ao seu emprego
anterior.
Perante isto, parecia chegado o momento de parar para
pensar, num contexto europeu em que surgem mais dúvidas do que certezas e em
que já não é possível prosseguir a sangria de recursos materiais e humanos de
países exauridos. O momento de ouvir as propostas alternativas que têm surgido
no debate público e de aprender com as experiências de outros, assumindo uma
posição que devolva alguma dignidade ao país e à sua liderança política,
subjugada por forças externas a quem se agarrou para chegar ao poder. Não foi
esse o entendimento do Presidente da República. Resta saber se a sua decisão
permitirá recolocar a responsabilidade e a racionalidade no centro da decisão
política. Porque com o modelo de referência do mundo adulto que nos trouxe até
aqui, então as crianças não merecem os adultos que têm.
Lígia Amâncio, in Jornal Público de
15/07/2013
Lígia Amâncio é psicóloga social e professora catedrática do ISCTE
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